E o que fica é
Sempre que me perguntavam sobre saudades, minha pronta resposta era afirmar com muita certeza “não sinto, o que se faz ausente não merece seu espaço guardado”, mas aí moravam muitas mágoas e dores, muitas outras questões sobre outros que, até então, não conseguia entender, sequer pude. Dessa forma, tive de encontrar uma maneira de lidar com aquele punhado de faltas, ausências, promessas descumpridas. Eu era criança, cresci rápido.
Quando pude me dar conta estava por aqui numa vida quase adulta, ou completamente adulta, sem muito experimentar cumplicidade, apoio emocional, companheirismo, foi sempre eu para os outros, o que ficava de mim sobre mim e para mim era coisa de mais, talvez até além do que eu poderia lidar, aguentar.
Aguentei, como gostam de chamar: “guerreira”, e é muito cansativo viver sua vida como se fosse um campo de guerra, onde muitíssimas batalhas são travadas, tem um dado momento que só se quer desistir e olhar para o céu a fim de encontrar um mínimo de paz. Não tem, não é a opção. Porque até então, o que fazia para os outros, a disposição das portas emocionais abertas tornou-se uma lei, não me era mais permitido fechá-las, negar os visitantes, eu apenas poderia aceitar a todos, independente do espaço que ocupariam e suas cargas emocionais. “Você pode segurar para mim?” “Por quanto tempo?” e nunca mais vi, seguro tudo de todos, há muito tempo, mas ninguém segura para mim por alguns segundos que sejam.
Além disso, sempre ficou a sensação de que sou uma casa de descanso, onde todos podem vir, ter uma boa conversa, boas ideias, afagos e cumplicidade, quando estão cheios, revividos de si mesmos, vão embora e deixam suas bagunças por aqui, porque afinal, a casa de descanso é minha e sou eu quem tem que limpá-la, organizá-la para esperar o próximo viajante. Quero destruir essa casa, estou farta disso.
Isso gerou um ciclo vicioso de abandonos, tanto meus, quanto dos demais, “se eu abandonar antes isso aqui, não vai ter tempo para o outro dizer que não quer mais” era o que pensava sobre, as relações eram sobre quem abandonaria quem primeiro, quem evitava cair mais nas dores de amores fracassados, aquela velha história romântica carcomida. Acumulo rostos e carinho por todos, entendi que nunca deveria ter sido sobre isso, mas foi.
Hoje já sei que posso sim contar com as pessoas, mas ainda tenho receio, também tenho a terapia, ela ajuda a sentar comigo mesma e ser minha casa de descanso para mim, apenas. Mas é difícil, ainda acho que não caibo na vida de ninguém e preciso ser excelente acompanhante e dar tudo de mim, para que só assim, possam enxergar que eu ainda estou ali, talvez eu esteja sendo ingrata com quem está na minha vida por quem eu sou e não só pelo o que ofereço a elas e peço desculpas por isso, só entendam, é que dói ainda. Infelizmente, é o que fica.